domingo, 30 de novembro de 2008

"'Baiano’ é uma categoria histórica"


“Ao contrário do que se parecem sugerir as nossas diversas fantasias da ‘baianidade’, ninguém é ou foi ‘baiano’ por conta de algum decreto divino. ‘Baiano’ é uma categoria histórica, gerada na convergência de determinados processos sociais”.

Antonio Risério em A história da cidade da Bahia.



A Bahia, berço do Brasil, assim como o resto do país nasceu através da heterogeneidade caracterizada pela mistura das culturas européia, africana e indígena no período colonial. E a partir disso, surgiu um povo singular de características únicas construídas ao longo da história.

O primeiro traço da exploração colonial e talvez o mais forte no povo baiano é a fé. Com os jesuítas, os portugueses tentaram civilizar o povo indígena e também os africanos escravos. Mas, como a cultura européia não conseguia impor sua supremacia cultural nem civilizar os seres habitantes e os trazidos para o trabalho braçal, formou-se aos poucos a fé sincrética que ressalta o que chamamos Bahia de Todos os Santos.

A heterogeneidade étnica e sociológica na fé baiana mostra como as raízes culturais se misturaram, principalmente a religião católica européia e o candomblé (na verdade, a própria religião africana aqui tem traços singulares, pois surgiu com a reunião de escravos de diversas nações da África). Vale ressaltar que esse tal de sincretismo não tem nada de belo, nem muito menos foi um processo pacifico. Na verdade, os escravos tiveram nisso a única maneira de terem seus costumes “aceitos” na sociedade brasileira.

Hoje, na capital com mais igrejas católicas do Brasil, os orixás do candomblé dançam (ou deveriam dançar) no Dique do Tororó (lugar que já foi ponto turístico e que hoje, se desejar, é melhor tirar fotos do alto ou de dentro do carro), e para quem não quer dizer que é filha de Iansã, diz que é devota de Santa Bárbara (não que não haja devotos fervorosos de Santa Bárbara na Bahia). Na verdade, para quem vê de fora a Bahia é uma sopa de santos, ritos, crenças. Como já dizia um querido professor que tive Carlos Magno “Sou, católico, apostólico, BAIANO”. Ou seja, na Bahia, todo mundo é um pouco de tudo.

Atualmente, vivemos uma guerra santa em que, os evangélicos expulsam exu das pessoas na televisão, o candomblé está clareando e o catolicismo escurecendo. Não quero parecer preconceituosa, mas o com a indústria do turismo faturando com os passeios dos estrangeiros nas terras baianas, com o sucesso da fitinha do Sr. do Bonfim, trancinhas rastafari e andar de havaianas nas ladeiras do Pelourinho, ficou chic ser adepto do Candomblé (novamente, acredito que existem adeptos fervorosos dessa religião).

Não que passear pelos terreiros e conhecer uma parte da cultura religiosa do brasileiro seja errado, até porque milhares de pessoas viajam todos os anos para ver as igrejas do Vaticano, as sinagogas de Meca, entre outros. Mas, como baiana que sou procuro entender onde está realmente a fé dessas pessoas, no que elas acreditam? Visitar e conhecer a vida e a cultura de um povo aumenta a nossa percepção do mundo e de nós mesmo, mas explorar a religião de um povo como mercadoria turística é depreciar toda uma evolução histórica, étnica e cultural de uma nação.


Catharina Gonzalez





"Eu acredito em Deus, sou católica: batizada, crismada, fiz primeira comunhão, vou à missa, confesso, comungo tenho uma relação muito profunda com Nossa Senhora. Não tenho muita intimidade com Deus, e o modo de chegar até Ele é através de Nossa Senhora. Com Ela tenho uma relação de intimidade, com todo o respeito. Me sinto à vontade para conversar com Ela, para chorar, sorrir, cantar para Ela, reverencia-la. Através dela peço para que minhas orações cheguem a Ele. Minha relação com a Mãe Menininha era mais ou menos assim, tentava chegar aos deuses africanos por meio dela. E quando ela adormeceu fiquei muito triste, porque senti uma grande saudade”. Maria Bethânia.

http://www.geocities.com/WestHollywood/Parade/1347/main5.html

Um comentário:

Unknown disse...

beau texte!
Se somente o exemplo da Bahia pudesse iluminar o resto do mundo.